2001: RENATO MATOS PÓS-QUALQUER COISA PÓS-GERAÇÃO MODERNA

RENATO MATOS PÓS-QUALQUER COISA PÓS-GERAÇÃO MODERNA

(Mário Pazcheco)

 

Renato Matos_Ziriguidum

Renato Matos pedala o Zirigdum do Além - Foto: Rui Faquini

No manifesto antropológico de Oswald de Andrade, “A alegria é a prova dos 9” e Renato Matos é uma de suas personificações.

O seu sorriso abundante e sem hora marcada recupera a imagem dos nossos antepassados felizes às margens do Atlântico antes que fossem demarcadas as capitânias hereditárias e suas cortes tolas nos obrigando a trabalhar...

Geralmente o fã acompanha o artista nos recortes de revistas, o assiste na tevê, corre pra pegar o autógrafo, vai pra cama, leva fora e é botado fora do camarim, almoça, liga, perturba aperta não perde nenhum show sabe mais da vida do artista do que os seus próprios documentos. Para sanar essa carência/necessidade quase atávica esforços não são medidos, ser reconhecido pelo ídolo às vezes nos leva até a Casa de Repouso Mental.

Minha admiração por Renato Matos não foi tão extrapolada, mas eu sempre o perseguia para que ele me falasse de Walter Smetak e outros encantos experiências. E falasse dos seus papéis no cinema nacional sob a direção de Nelson Pereira dos Santos, João Batista de Andrade e André Luis de Oliveira.

Quando eu o via em “Zoio d’água” eu gritava: Olha o Renato Matos! Só para provocar nos moradores aquela frase incômoda: Você ainda vai se acostumar com ele!

O tempo passou e Renato Matos criou o “Zirigdum do Além” a última guerrilha musical...

De Olhos D’Água, munido de sua fauna de cabaças retiradas do cerrado, tubos plásticos coloridos e utensílios, ele exportou e rompeu as ancas da tradição das alfândegas européias para levar seu som nativo à França. Perdido no aeroporto internacional de Paris empurrava uma caixa maior do que ele e desesperadamente procurava encontrar uma pedra... Para bater no arco do berimbau...

Voltou no inesquecível setembro de 2001, e nos encontramos no ‘Terraço Shopping’ durante uma sessão de autógrafos de TomZé outro modernista sem casaca.

E nesse encontro, eu sempre com a pulga atrás da orelha encontrei a sonoridade “além” que procurava em Renato Matos e entrei em contato com a movimentação orquestração do “Zirigdum do Além”.

No “Zirigdum Do Além” o som é feito a partir da afinação e o músico/tocador participa como peça essencial o motor humano que com suas mãos em volta das 30 cabaças/berimbaus parece fazer parte desta máquina sonhadora de fazer sons.

O “Zirigdum do Além” não é uma batucada para espantar monge no halloween são tubos conexões expostas imantando neo sons sobressalentes, sobreposições esganadas e explorações poéticas.

Cassetadas do tempo

Outro projeto musical estratosférico de Renato Matos são as “Cassetadas Do Tempo”, o vem a ser? São várias várias fitas gravadas por Renato Matos ao largo de sua vida algo em torno de 1000 fitas com momentos ao vivo, discursos de rádio e tevê registros inéditos de suas músicas, shows gravados na América na França e por aí. No processo, ele usa um gravador, que condicionado aos toques dos dedos nas teclas do play ou review colam trechos urbanos, concretos de trip hop e do reggae big beat e uma mesa de efeitos recria o áudio e as mixagens instantâneas geram novos sons. Todo o movimento é ao vivo e surgem inserções com o violão criando frases ou o uso do agogô. Ali também nascem as frases gramaticais para novas letras de inusitada originalidade. Diálogos etéreos e diáfanos de Tvsky, tortas flamejantes e tcha cum drums tribais. Linguagens revistas ofício experimental protegido pelos véus de Hélio Oiticica.

Por duas oportunidades no seu apartamento columbário noturnamente viajamos no som sem registrar!

“Fome & Seca: Sedução”

Andamentos obliterados – hieróglifos descendo de op-partituras. No novo apartamento nicho de Renato Matos sua história está espalhada pelo chão: revistas de arquitetura, de antropofagia, clássicos da literatura mundial, revistas não mais vistas, fitas master de discos e o toque do celular explicando por que o seu próximo disco ficou para o ano que vem...

A música de Renato Matos é pequena para alguns brasileiros, por isso, sua música abraçou as muralhas da China, os picos da Cordilheira dos Andes, as aldeias africanas ou os palácios de Versalhes. Estes brasileiros pequenos perguntam: - Porque você ainda não estourou?

Eu fico feliz por saber que Renato Matos continua ali na 706N, resistindo e brutalmente criando o TNT para a explosão definitiva dos alicerces da falsa notoriedade.

 discosppiloto   'Plano Pirata', uma espécie de repertório de Renato Matos

    Faixas

   Coisa Pagã, Mamagaya, A cidade quer, Malê de balê, Pra quê, Pudim, Raga da baleia, Trombetas, Solidão celular / Telefone é muito pouco

   Renato Matos se ocupa enquanto a sua transferência para Salvador não acontece... Ele intercala suas produções com mais um CD-Pirata de sua própria lavra, batizado de "Plano Pirata" que antecede ao posterior lançamento oficial que será "Plano Piloto"... Plano por plano a gente mergulha nestas oito faixas de cabeça. A música é um artefato curioso - há anos eu venho nutrindo ojeriza por álbuns estudados e bem gravados feitos para o comércio exterior.

   Plano Pirata é uma amostra para quem gosta da "poélírica" e do ritmo de Renato Matos. Se você tem algo contra o artista este disco não ajuda muito a mudar o seu ponto de vista. As duas músicas de abertura, Coisa Pagã e Mamagaya privilegiam o ritmo do reggae; outros privilegiados são os parceiros de Renato Matos resgatados para este show: o saudoso Manduka, os atuantes e não menos lendários Calouro, Reinaldo Jardim, Cristina Roberto, menezes y morais e Tetê Catalão; são referenciados, repito este disco é um privilégio do artista, uma homenagem reconhecimento a si mesmo e a cidade que gerou todas as estrofes e situações. Muito à vontade o disco traz uma apresentação da banda Pão.com e Flora Matos aparece bem na fita cantando Solidão celular / Telefone é muito pouco...

Plano Pirata com a sua impactante capa dos rolos-compressores esmagando a extensa produção anônima dos espertos. Poderia realmente mudar a realidade se não estivéssemos na cidade do faz de conta, imprimindo mais um flagrante para a propaganda estatal. Por isso quem já virou todas as madrugadas vai se achar na faixa A cidade quer neste refrão-identidade de muito dos seus habitantes e o monólogo Pudim de Cristina Roberto, mais real do que qualquer peça de Sam Shepard.

Para quem esteve em algumas dessas apresentações é como levar o show para casa e curtir o íntimo do artista. Este álbum é muito pessoal, Renato Matos selecionou falas e trechos e apresentações e overdubs e ecos gritantes da situação urbana de Brasília e seus filhos fruto da Utopia candanga. Neste próprio disco ele faz propaganda do próximo: que terá a participação de Cássia Eller e lê alguns nomes e os narra como mercadorias de consumo nos supermercados da vida. É a enésima vez que eu ouço o disco e o farei no rompante do ano... Aqui existe mais do que música, existe muita vida. Então, longa vida a Renato Matos e seus parceiros.

 

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