Postura Anárquica (1986)

CORREIO BRAZILIENSE
Brasília, terça-feira, 29 de abril de 1986

Promoção New-Rock premia felizardos

Postura Anárquica

MÁRIO SERGIO PACHECO

Voltando no tempo, situamos em Frisco, no Verão do Amor, para ser bem preciso, 1965. Aparentemente calmos os bairros Haight e Ashbury, uma nova cultura nas ruas dava o tom — e uma faixa de saudação colocada no “Haight” por sociológicos moradores recepcionava os turistas com os dizeres:
— Bem-vindos a Mea de Acid-Rock.

A resposta veio pelas empresas comerciais. A Contracultura então passava dos jornais aos discos de plástico. Aliás, foi em um destes plásticos de Jimi Hendrix que a garotada se ligou na nova maneira de contestar os valores estabelecidos pela América.

Os habitantes da cidade sabiam que a música estava intimamente ligada a um estilo de vida, daí que o Festival de Monterey foi um marco. Surgia a geração que virava as costas ao sonho americano, enquanto era convocado, convocava a Revolução do Século, que seria responsável por uma diferença de posturas. Jornais underground, livros, peças teatrais e filmes de revelação e confronto nos divertiam.

Tudo isso viraria apenas dados aos olhos de uma efervescência cultural mundial, na já distante manhã de 1967, no Golden Gate Park, com a reunião da Comunidade Hippie de San Francisco. Era a explosão dos poetas beats, uma galeria de bandas e espiritualistas da Califórnia — e a necessidade de viver em comunidade era um ato ético.

Houve por todo o verão em 1967 o uso ilimitado de música e LSD. Um único evento com todas as tribos. A polícia apenas se limitava a separar alguns canabinóides dos psicodélicos e a impedir que os mendigos interferissem nas visões cósmicas da moçada de cabelos longos. E tudo o mais era permitido. E tudo o mais era permitido.

A música, não mais de protesto, era a trilha sonora dos que se libertavam dos valores da civilização industrial e mergulhavam no espaço livre do novo homem. A Música era o próprio grito de guerra, de uma geração que queria mudar o mundo.

Grupos como Jefferson Airplane, Grateful Dead, Captain Beefheart, Moby Grape, Country Joe and The Fish, Quicksilver Messenger Service, Electric Flag, Big Brother and the Holding Company e outros formaram um novo som, uma nova maneira de fazer shows e de pensar a realidade.

Muitos se ligavam ao movimento Beat, outros à Burroughs e sua galera que combatia a repressão cultural e sexual. O “Estado” era o grande vilão. As drogas eram os passaportes da Percepção, impressas e memorizadas com o tema Paz e Amor.

O sensacionalismo e a caretice dos jornais descreveram os novos ídolos, as novas roupas e as novas danças e toda a rebelião adolescente se concentrou na explosão do “Sgt. Peppers”. O “Haight” foi o último “passeio” possível, marginal para as artes e para os novos valores.

Dez anos se passaram, e com ele o “taste” com Rory Gallagher, Patti Smith e Aerosmith. A esperança era ver Eric Clapton junto a Janis Joplin. Mas Janis já estava com os heróis do céu da música. Clapton encontrava seus mestres de Chicago e a moçada curtia Led Zeppelin e Carlos Santana.

Os Stones já eram respeitados, e os Beatles também. Mas o que realmente interessava era a liberdade, as histórias de amor e os improvisos de jazz que nasciam no calor dos shows. A moçada se ligava nos “bode-expiatórios” de toda uma geração. Mês de Keith uma brasa perdida na prisão. As voadoras à primeira barra de igreja à tocar o Fear e o Black Flag. E o peso do Rock, do Psicodelismo e dos excessos.

E novamente, em uma rápida reflexão, já estávamos no meio de Atlanta, Monroe e a paz da geração Monterey pouco a pouco sumia, ficando apenas algumas ilhas de resistência, nos blues londrinos e nos arroubos poéticos de Morrison. E a cidade voltava à repressão, com suas cercas douradas e suas boas moças de self-service.

E de novo, os jovens se uniram em paz para fugir das guerras e da caretice. E a nova Califórnia, surfista e psicodélica, encontrava no Brasil alguns fiéis seguidores que passaram os anos 70 entre a flor, a lisergia e o recomeço.

O rock nacional viu nascer em sua praia de Ipanema, em Icaraí, no Leme, no Guará, no Conic, na W-3 Sul, no Setor Bancário, as primeiras experiências de libertação pelo som. À margem da mídia, bandas underground furaram o bloqueio da caretice e do disco-music.

Havia os que ligavam para o que estava por vir e foram esses que tornaram possível este New-Rock. Um novo tempo que surgia não só em Brasília, mas também no Recife, em Belo Horizonte e Porto Alegre. Os porões, os barracos, os centros comunitários, os lugares onde aconteciam os shows underground, gritavam contra os que vinham e vinham com os velhos discursos da nova ordem.

O New-Rock não era uma tendência musical, era um grito de liberdade, de paz e de amor. E hoje, em 1986, é a “onda” que nos aproxima da verdade e da reconstrução da nossa imagem, onde a repressão moral se transforma em fantasia e a nova postura é a “postura anárquica”!

Nunca imaginávamos que, nos anos 80, a juventude voltaria a se encontrar em si mesma. Mas voltou e trouxe novamente as cores vivas do passado. As novas bandas de Brasília, Recife e Belo Horizonte são o retrato da nova contestação. De novo, o “Estado” é o vilão. De novo, o sistema é o que se combate. A rebeldia ainda é o nosso sonho, a crítica a nossa arma.

Punk, New-Wave, Hardcore, Pós-Punk, Pós-Tudo, Ratos de Porão, Legião Urbana, Plebe Rude, Paralamas, Ira!, Picassos Falsos, Camisa de Vênus, Fellini, Violeta de Outono, Nau, Agentss, Inocentes, Mercenárias, Lobão, Titãs, Barão Vermelho, Zero, RPM, U 2 Resgate e uma série de novos grupos nos fazem crer que o New-Rock é possível.

Muito (Robbie, John e Ray). Mais muito amor no coração. E esta é a nossa conclusão de um encontro musical, após mil prêmios e mil ideias. Afinal o New-Rock é como o “coração de estudante”, do Milton, um eterno recomeço!

E que venham todos os que não têm medo de experimentar o novo. Que surjam todos os que não têm medo de pensar. E que a música esteja com todos os que querem sair da alienação. A nova postura é a “postura anárquica”. O novo tempo é este. A nova linguagem é o som. A nova mídia é o corpo. A nova dança é a da liberdade. E o New-Rock é você.

JIM MORRISON / Rolling Stone 04.08.71:
“Há 15 anos as portas da percepção foram abertas. O homem começou a ver o mundo como realmente ele é: infinito. A música agora tem que ser libertadora. A TV está falida e a política só pensa no poder. O que temos a fazer é dançar e cantar. Eu volto em 15 anos com Jim Morrison.”

86 maio

Articles View Hits
12574017

We have 1485 guests and no members online

Download Full Premium themes - Chech Here

София Дървен материал цени

Online bookmaker Romenia bet365.ro