NEAL ADAMS REFLETE CARREIRA NAS HQS: “EU QUE FIZ OS AUTORES GANHAREM DIREITOS”

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LENDA DOS QUADRINHOS, NEAL ADAMS REVELA SEGREDOS EDITORIAIS DA MARVEL E DA DC
Por Claudio Yuge | https://canaltech.com.br/quadrinhos/lenda-dos-quadrinhos-neal-adams-revela-segredos-editoriais-da-marvel-e-da-dc-158334/

27 de Dezembro de 2019 – Neal Adams é uma verdadeira lenda dos quadrinhos. O autor de 78 anos foi muito importante para o amadurecimento dos quadrinhos como uma linguagem — e arte — tão influente quanto qualquer outra mídia. E pudemos conhecer um pouco mais sobre sua história e os bastidores da indústria em sua passagem pela Comic Con Experience 2019, onde ele revelou vários segredos editoriais da Marvel Comics e da DC Comics.

Adams começou nos anos 60, deixando para trás os trabalhos em publicidade para contar histórias. Além de anatomia mais precisa e sombras realistas, suas principais habilidades eram surpreender o leitor com ângulos inusitados e narrativa iconoclasta para os padrões da época. Seu primeiro grande trabalho foi com Deadman, na DC Comics, em 1968, quando chamou a atenção de Stan Lee na Marvel Comics.

“Eu trabalhava na DC Comics na época e, quando desenhei um gás na capa da revista do Deadman, ele provocava um ‘efeito Jim Steranko’ (Steranko ficou famoso por brincar com ilusões de ótica em suas capas nas histórias do Nick Fury, para a Marvel Comics)”, recorda o autor. Em seguida, ele foi chamado pelo próprio Stan para uma conversa.

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Neal Adams and Stan Lee at Comic Con 2010

“Entrei no escritório de Stan Lee e ele era muito empolgado, pulava sobre sua mesa como um palhaço no circo — não era a pessoa séria que pensava que era. Então, cheguei e disse a ele que já vinha trabalhando com a DC, mas que poderia trabalhar ‘no método Marvel’, porque eu tinha tempo para isso. Então perguntei a Stan o que tinha disponível para mim e ele disse: ‘qualquer revista que quiser’”.

Esse ‘método Marvel’ a que ele se refere era como se chamava um processo criado pelo próprio Stan, em que o artista criava e desenhava a história, enquanto os balões eram preenchidos pelos roteiristas. “Isso me deixou muito bravo com o Stan, porque ele inseria diálogos em seis revistas por semana. Ninguém consegue fazer isso. Mas ele conseguia”.

E foi assim que Adams passou a fazer parte de uma equipe que contava com Jim Steranko, Jack Kirby e Roy Thomas. Aliás, foi com esse último que ele fez parceria para revitalizar os X-Men.

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X-MEN ESTAVA PRESTES A SER CANCELADO
Foi na fase com os mutantes que Adams floresceu para o mundo, com um estilo nunca antes visto nas histórias de super-heróis. A representação do corpo e dos movimentos, assim como dos ângulos das sequências de ação, e até mesmo nas capas, foi um marco nos quadrinhos do gênero.

“Stan disse que me chamou para conversar porque a única revista da DC lida na Marvel na época era a que eu desenhava, Deadman. Então, quando ele me ofereceu um trabalho, perguntei qual era o título menos vendido. Ele disse que X-Men seria cancelado em dois meses. Quis fazer X-Men, porque, como estava para ser cancelado, podia fazer o que quisesse — ninguém estaria prestando atenção mesmo (risos)”, recorda o autor.

Adams afirma que uma parte do acordo com a Marvel era tornar os X-Men tão bem-sucedidos quanto os Vingadores. “O que vou dizer não faz muito sentido agora, mas, na época, era engraçado: Os Vingadores eram uma porcaria. Então fechei o acordo”, lembra. Depois disso, ele desenhou várias edições dos mutantes e chamou a atenção de todos justamente por conta da inovação narrativa que a revista apresentou.

A CONSAGRAÇÃO COM BRAVE AND THE BOLD E BATMAN
Brave and Bold foi a primeira vez que Adams desenhou Batman, justamente na época em que o seriado de TV do Homem-Morcego perdia a força e todos estavam cansados daquela versão caricata do personagem, em 1968.

“Cheguei para Julius (Schwartz) e pedi para fazer uma história do Batman. Ele mandou ir embora de seu escritório. Mas, depois, ele pediu ajuda para criar algo para o personagem, que na época tinha seu seriado encerrado. Nessa época, o Batman andava de dia por aí com uma cueca sobre a calça. E nenhuma criança se perguntava: ‘mãe, por que esse cara está usando cueca sobre a calça’. Bem, o Batman rasteja à noite, nas sombras. E não de dia por aí com uma cueca sobre a calça (risos)”.

Foi assim que nasceu, então, uma antítese daquela versão da atração televisiva. O Batman de Adams passou a ser mais sombrio e interagiu com personagens como Deadman, Sargento Rock, Aquaman, entre outros. “Minha única restrição para fazer essas histórias é que o Batman não saísse de portas dizendo ‘Oi, eu sou o Batman!’ e que atuasse sempre à noite. Ah, ele tinha de sair do armário — mas não dessa forma que estão pensando (risos).”

Isso o levou a outros grandes projetos, como sua elogiada fase no Lanterna Verde e o Arqueiro Verde. Adams se lembra que, ao apresentar a ideia inicial do que viria a ser o On the Road dos quadrinhos, a DC Comics chegou a ridicularizar o conceito de “dois caras vestidos de verde por aí” redescobrindo a América. “Mas o que fizemos, eu e Dennis O’Neal, mudou o jeito de fazer quadrinhos para sempre.”

A BRIGA COM O COMICS CODE AUTHORITY
Adams era muito engajado na luta dos direitos dos quadrinistas. Até hoje ele encabeça reuniões sobre royalties que as editoras devem aos profissionais, incluindo a briga da família Shuster sobre os direitos do Superman junto a DC Comics — algo que ele disse ser “uma história muito longa” e que um dia vai “contar em um livro”. E, naturalmente, foi contra o famigerado Comics Code Authority (CCA).

Criado nos anos 50, o CCA nasceu de devaneios do psiquiatra Fredric Wertham, que conseguiu convencer pais e professores sobre a ameaça chamada “quadrinhos”. Ele descontextualiza os subtextos de várias histórias para dizer que haviam “mensagens ocultas” para seduzir crianças — seu livro chama-se The Seduction of the Innocent.

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Quase 20 anos depois de estabelecido, o CCA encontrou um grande oponente: Adams, em início de carreira, era mais irônico e gostava de criticar o governo Nixon. O desenhista comenta que chegou a ter problemas com o governo da Flórida e com editores, que não gostaram de sua representação do então presidente dos Estados Unidos e de Jesus Cristo em uma história do Lanterna Verde.

“Uma outra vez, fiz uma história dos X-Men em que queria desenhar um vampiro. O CCA proibia a ilustração de vampiros, monstros e lobisomens. Então, pensei que, em vez de um ser que suga seu sangue, ele pudesse sugar energia. Isso não seria caracterizado como um vampiro, então desenhei. Eles (CCA) nem desconfiaram, então, mesmo que fosse de forma limitada, era possível driblar o código.”

A POLÊMICA CAPA DE RICARDITO USANDO DROGAS QUE DERRUBOU O CCA
Outro episódio lembrado por Adams foi essencial para a queda do CCA nos anos que viriam. Até hoje a edição em que o sidekick do Arqueiro Verde, Ricardito, aparece usando drogas com uma seringa na capa do título é considerada um divisor de águas sobre a importância da nona arte fora das revistas. A história tinha um teor muito mais adulto do que normalmente era vendido para crianças e mostrava uma grande preocupação sobre o vício em entorpecentes. Foi chocante para a época.

Adams lembra que houve muita resistência no uso dessa ilustração, ninguém na DC queria usá-la.

“Mas daí, o Stan Lee, em uma história do Homem-Aranha, mostrou Norman Osborn abrindo um frasco de pílulas. O CCA, claro, disse que ele não poderia fazer aquilo. Mas daí ele perguntou ao seu tio burro, o editor (risos), se poderiam publicar sem o selo do CCA. Então, eles publicaram sem o selo. Nada aconteceu. Ninguém disse nada, nem notou que o selo não estava lá.”

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Segundo Adams, foi aí que a indústria e os leitores passaram a ignorar o CCA, que, em seus primeiros anos, funcionava como um “selo de qualidade” e poderia comprometer as vendas. O fim do CCA foi um grande marco para o setor, que, depois disso, deu muito mais liberdade criativa para seus autores — ou seja, se hoje temos histórias adultas em quadrinhos no mercado mainstream, devemos bastante a esse capítulo, em especial da história dos heróis norte-americanos.

“Os editores da DC ficaram com minha capa por três meses em sua mesa e não conseguiram enfrentar o CCA. Stan Lee venceu sozinho a DC Comics. E foi aí que todo mundo percebeu que o CCA não era a ‘polícia’ e sim eram as próprias companhias de quadrinhos monitorando e criando regras para si mesmas. Em quatro dias, todos derrubaram o CCA, e Julius Schwartz ordenou que minha capa fosse publicada.”

HQ PREDILETA
Há uma revista em especial na ampla biblioteca de trabalhos de Neal Adams. Ele afirma que é o clássico encontro entre Superman e Muhammad Ali, em uma edição de 72 páginas, publicada em 1978, com roteiros de Dennis O’Neil. O artista afirma que estudou bastante o movimento dos boxeadores para fazer uma fiel transposição da luta no papel.

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NEAL ADAMS REFLETE CARREIRA NAS HQS: “EU QUE FIZ OS AUTORES GANHAREM DIREITOS”
Quadrinista comentou sobre Batman, indústria dos quadrinhos e publicidade na CCXP19

ÉRICO ASSIS
https://www.omelete.com.br/ccxp/ccxp19-neal-adams-reflete-carreira

11 dez. / 2019 – “Editores são burros”. Foi o mantra que Neal Adams repetiu várias vezes durante sua apresentação à plateia do Auditório Ultra na sexta-feira (6), segundo dia da CCXP19. Ele disse que é uma constante na sua carreira ter que ensinar aos editores de quadrinhos o que eles deviam fazer.

Por exemplo: o direito dos autores aos royalties, ou participação por vendagem, batalha que Adams encampou nos anos 1970. “Levou um tempo pra botar a noção na cabeça dos editores”, disse o artista, atuante nas HQs desde 1960. “Eu tive que explicar: ‘Olha, se o roteirista e o artista tiverem direitos a royalties, eles vão trabalhar com mais prazer, e aí o trabalho vai ficar melhor, e aí você, dono da editora, vai vender mais e vai ganhar mais.’”

Adams disse que outros autores não defendiam seus direitos porque tinham medo de perder o emprego. “Eu sei que é muito ego dizer que eu não tenho medo. Mas você não pode ter medo com editores. Ainda mais hoje, que você pode dizer pra eles: ‘Se não me pagarem direito, eu abro a minha editora.’”

O autor emendou várias histórias no painel com verve e cadência de comediante de palco. Algumas:

“Me convidaram várias vezes para vir ao Brasil. Mas na época eu trabalhava muito com publicidade, porque publicidade paga quatro, cinco vezes mais do que pagam em HQ, pela mesma quantidade de trabalho. Parei com a publicidade, voltei pros quadrinhos e, por conta disso, tive que voltar às convenções – e tirar o dinheiro de vocês. Então, passem lá na minha mesa, comprem umas prints e compensem o déficit na minha renda.”

“Eu não ajudei os autores a terem direitos. Eu que fiz os autores ganharem direitos. Nas editoras, eu via gente jogando original no lixo. Uma vez falei pra um cara que, se ele fizesse isso de novo na minha frente, ia levar um soco na cara. Levou anos, mas começaram a devolver os originais. ‘Se vai colocar no lixo, então devolva pro artista’, eu dizia. E eles perguntavam: ‘Por quê?’. ‘Porque você é burro.’ Burro que nem o Donald Trump, aliás.”

“Nos anos 1970, eu estava lá na minha mesa, trabalhando, tranquilo, e o [editor] Julius Schwartz veio me mostrar um fanzine mimeografado. Quem escrevia? Os fãs. Quantas cópias tinha aquilo? Doze! Aqueles malucos viraram vocês. Hoje tem 100 convenções nos EUA por ano que passam de 20 mil em público. Tem outras 200 com público entre 2 e 10 mil pessoas. Nós estamos dominando o mundo. E sem matar ninguém.”

Adams também foi um dos primeiros artistas a trabalhar simultaneamente para Marvel e DC sem usar pseudônimo – nos anos 1960, havia a regra tácita de que quem colaborava com uma editora não podia colaborar com a outra.

“Eu trabalhava pra DC e conversei com o Jim Steranko. Ele me falou do Marvel Method [o método de roteiro de Stan Lee, com mais liberdade para o desenhista contar a história] e eu me interessei em fazer alguma coisa daquele jeito. Fui na Marvel, estava na sala do Stan. Ele se entusiasmou, começou a pular em cima da mesa, aquelas palhaçadas que ele fazia. Ele me disse para eu pegar a série que eu quisesse. Perguntei: ‘Qual é a que menos vende?’ X-Men. ‘Então quero fazer X-Men.’ Stan propôs um acordo: ‘Você faz X-Men, aí cancelamos e você passa pra uma série importante, tipo Vingadores.’ (Na época isso era piada, pois Vingadores era um saco.) E o Stan perguntou: ‘Como você quer aparecer nos créditos?’ Falei que queria com meu nome. Ele respondeu: ‘Talvez não gostem na DC’. Eles que vão se catar. Stan insistiu, ‘Quem sabe Lutherios Neal?’, eu disse: ‘Stan, que nome imbecil'. Ele insistiu que a Marvel poderia não gostar… Quando eu disse ‘Então tchau, Stan’, ele me pediu para esperar. E aquele foi o último dia em que alguém teve que usar pseudônimo pra trabalhar em outra editora".

SOBRE BATMAN

“Era fins de anos 60 e o seriado de TV tinha acabado. O Batman era um cara que andava de cueca na rua de dia. O Batman não é isso. O Batman tem que ficar à espreita, nas sombras. O Batman não entra pela porta. O Batman aparece, sai de dentro do armário - não naquele sentido de sair do armário. O Julius Schwartz me disse: ‘Por que é que eu recebo carta dessa garotada dizendo que o Batman de verdade é o que aparece na Brave and the Bold [revista que Adams desenhava, onde Batman contracenava com outros heróis DC] e não o que aparece nas revistas do Batman?’. Eu disse: ‘Julius, todo mundo sabe como o Batman tem que ser. Só vocês da DC que não.’”

Adams ainda defendeu que o Lanterna Verde John Stewart, que ele criou com Denny O’Neil, foi o primeiro herói negro de respeito nos quadrinhos dos EUA. “Os outros, tipo Luke Cage, eram caras de gangue, que falavam errado. Eu cheguei pro editor e falei que queria um cara negro, sério, com formação universitária, que ia ser Lanterna Verde”. O quadrinista ainda comentou a controvérsia de quando o filme do Lanterna trouxe o personagem Hal Jordan, branco, e não Stewart, conhecido de milhões de fãs a mais por conta do desenho animado da Liga da Justiça. “Podem apostar que, quando sair outro filme do Lanterna Verde, vai ser com o John Stewart.”

Ainda no tema dos heróis negros, o autor lembrou de Superman vs. Muhammad Ali, que ele considera sua HQ mais importante. E contou a última história:

“Uns anos atrás, numa convenção, apareceu um cara na minha mesa dizendo que tinha sido treinador do Muhammad Ali. Quando o Ali estava velho, doente. O cara na verdade era fisioterapeuta do Ali. Ele levei uma edição em capa dura de Superman vs. pro Ali autografar e o Ali perguntou se ele conseguia mais dez. O cara comprou, levou pro Ali. E os dois passaram a semana desmontando as edições, recortando as páginas e colando pela parede da casa. Que tal, hein?”.

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