Brian Epstein, o fazedor de sonhos
(Mário Pacheco)

"Embora todo mundo pense, nunca dormi com Paul. Nem com Brian Epstein. Mas estou guardando todos os segredos para meu livro: 'A História Real dos Fabulosos Beatles'". (John Lennon)

 

27 ago. / 1967 - "Brian Epstein falece vítima ao que parece, de excesso de drogas, ainda que se atribua igualmente o seu falecimento a um suicídio provocado por forte depressão".


     É difícil acreditar que o introspectivo e elegante, Brian Epstein acostumado a passar suas orientações na forma de bilhetinhos, aconselhando os Beatles a não fumar ou comer no palco era um "desinibido puxador de fumo".
     Os profissionais de sua equipe e agentes dos meios de comunicação, respeitosamente relembram Brian Epstein, como o homem que mandava, que mantinha contatos com as autoridades do fisco sempre protegendo as receitas dos Beatles em caso de calotes.
    Nestes documentários, os depoentes impreterivelmente se referem à memória de Brian Epstein como o cara gente fina jamais visto...
     Ainda no ínicio da relação profissional, Lennon quase liquidou Bob Wooler quebrando-lhe nariz, clavícula e três costelas do Dee-Jay residente do Cavern Club, porque este havia sugerido que a relação extrapolava o lado empresarial. Vivos Lennon teria que bater até no seu biógrafo autorizado, mas certamente Brian Epstein diplomaticamente resolveria com o ‘deixa pra lá’... Como usou noutras situações mais ambíguas.

     Inglaterra. Liverpool. Outubro de 1961. Além de proprietário da loja de discos NEMS, Brian Epstein também é colunista do jornal musical Mersey Beat. Será questão de tempo para que os Beatles cruzem seu caminho, surge no atalho, o garoto, Raymond Jones que pede o disco My Bonnie na loja de Brian Epstein que nunca ouvira tal grupo, mas que por interesse próprio procurará saber a respeito...
     Epstein escuta a banda no pub "The Cavern" em Liverpool, que era perto de sua loja de música e decide se oferecer como representante do grupo que levou ao estrelato.
     Janeiro de 1962, na casa de Pete Best, os Beatles efetivamente assinam com Brian Epstein, por iniciativa do líder, John: "Agora estamos prontos para ser empresariados por você. Onde está o contrato? Traga que eu assino".

As estratégias de Brian

     Na audição da Decca, além da execução híbrida de velhos standards com números de rock’n’roll, os Beatles ostentavam os velhos cortes e casacos de couro. Após a fracassada audição, solitariamente Brian Epstein pena um bocado nas ruas de Londres, batendo de porta em porta até conseguir um nova audição na Parlophone com George Martin, Brian Epstein, leva ao pé da letra cada recomendação do produtor (melhorar o equipamento e trocar o baterista), ele vai até a Jennings Musical Industries (JMI), fabricante dos amplificadores Vox, para propor um acordo: a Jennings dar todo o equipamento que o grupo precisa e eles fariam toda a propaganda que a fábrica desejasse.

     "Brian botava as nossas instruções por escrito, no papel. Nós vivíamos como sonâmbulos antes dele aparecer. Ele tentava nos limpar, limpar nossa imaginação", diz John. "Costumava repetir que nossa aparência não era a mais correta, que nunca seríamos admitidos num bom lugar. A gente costumava se vestir como bem entendia, mas Brian fez a gente entar para a turma do terno".

Do auge para o fim...    

     Com a turnê de 1967, cancelada, os problemas de Brian Epstein e a insônia levam-no a aumentar as doses, a revista "Rolling Stone" fala de uma tentativa frustada de suicídio ainda em 1966.
     
Paul chega a reclamar de Brian, percentagens maiores de royalties e maior participação administrativa na NEMS.
     "Paul é temperamental e inquieto, e às vezes difícil de tratar. Mas nós nos conhecemos muito bem e sabemos quando cada um de nós tem de ceder". (Brian Epstein).
     Se Brian Epstein concordava com a luxuosa capa de "Sgt. Pepper's", por sua vez os Beatles entregavam-lhe um compacto como Strawberry Fields Forever / Penny Lane, para as vendas de Natal.
    George Martin diz que era inevitável o rompimento do empresário com os Beatles. "Eles estavam transformados. Eram arrogantes e egoístas. Mas se Brian Epstein tivesse vivido, em pouco tempo teria ouvido dos seus rapazes: 'Quem é você para nos tirar 25% dos nossos rendimentos?' No início, o grupo não pensava em dinheiro, mas tudo mudou", revelou.

     Em agosto de 1967, quando o LP "Sgt. Pepper´s" está concluindo uma estadia de oito semanas em primeiro lugar entre os mais vendidos, Brian Epstein comete suicídio. Segundo as cartilhas antidrogas, ele tinha-os iniciado em muitas coisas: a estar em palco, na linguagem e, mais tarde, no ácido. "Epstein já tomava LSD há muito tempo quando os Beatles se começaram a interessar por isso". Brian Epstein morre de uma dose excessiva de barbitúricos - um paliativo para sua insônia crônica e tensão exasperante em que vivia, "às vezes, eu choro sem que eles 'vejam'".

     "Preciso continuar a tomar conta dos meninos. Não posso deixar que eles tomem contato com o jogo sujo dos negócios, com o lado desonesto do show-business. Caso contrário, eles podem até dissolver o grupo..." (Brian Epstein).

     "Brian Epstein sentiu que estava perdendo o controle de seu império por volta de 1966. Tinha ilusões de grandeza e se via com um Diaghilev moderno, acreditando que era o homem que inventara o maior grupo de todos os tempos e possuía o toque mágicos dos gênios", (...) "Sua vida privada estava se complicando e sofria com o fato de ser um homossexual enrustido em tempos que as leis de moralidade inglesa inda funcionavam. Ele sonha em ter uma relação estável comum homem como eu tinha com minha mulher". (...) "Mas não acredito que tenha se matado em 1967, como dizem alguns". (George Martin in "Playback". Editora Genesis 2002).

 

     "Quer dizer, nós fomos muito negativos depois que Epstein faleceu. Nós não fomos positivos. Por isso é que todos nós começamos a enjoar do grupo em diferentes ocasiões, você sabe. Não tinha nada de positivo. Era uma droga. Foi como quando a gente está crescendo e o papai vai embora e deixa a gente por conta própria. O papai agora foi embora, sabe, e estamos no nosso próprio acampamento de férias. Sabe, acho que ou a gente faz a coisa ou volta pra casa. Nós precisamos é de disciplina. É como tudo que você faz, você nunca teve disciplina. Mr Epstein disse: 'vistam ternos', e nós vestimos. E nós estávamos sempre brigando um pouco contra essa disciplina. Mas agora é bobagem lutar contra uma disciplina que é nossa mesma. É uma disciplina auto-imposta agora, e por isso fazemos tão pouco. Mas acho que vamos precisar fazer mais do que isso se quisermos continuar". (Paul McCartney).

     "Nós nunca teríamos conseguido chegar lá sem Epstein e vice-versa. Ele trabalhou tanto quanto nós no projeto Beatles no começo, embora nós fossemos o talento e ele a máquina. Ele não era suficientemente poderoso para nos ter obrigado a fgazer o que nós não queríamos". (John Lennon, ago. / 1971).

"Brian adorava lugares sujos, barra pesada". Nat Weiss

     Cabelos grandes, liberdade além de mascar chicletes... tudo fruto das estratégias de armário de Brian Epstein, um cavaleiro da revolução sem condecoração - fazedor de sonhos - ator frustrado por não estar no palco de um drama vitoriano de Shakespeare mas com vocação empresarial.

"Brian Epstein construiu um império, mas viveu tempo demais, tempo suficiente para sentir o vazio do tédio e do ócio. Quem trabalha o dia inteiro, das oito às cinco, não sabe a sorte que tem. Isso controla sua mente, protege a pessoa dela mesma. Acalma o ego. (...) Será que Brian Epstein jamais soube como ele mudou o mundo? Será que ele estava preso ao cometa dos Beatles? Ou seria o contrário? Será que foi um golpe de sorte que poderia ter acontecido com qualquer um ou teria sido uma estratégia planejada de modo magistral (dez discos nos 10 primeiros lugares das paradas ao mesmo tempo!)? Nunca saberemos, e se John e Paul sabem, eles por certo não dirão jamais. (...) Se Brian Epstein não tinha realmente nada a ver com o sucesso dos Beatles, então sua morte pode ser compreendida com mais facilidade. Podemos imaginá-lo inútil, sentindo-se, talvez, como um joguete das circunstâncias, sem ter contribuído em nada para isso. Sentindo que ele não tinha coisa alguma a oferecer. Afinal ele mesmo se descreveu, em sua autobiografia, como uma pessoa apagada, que só despertou para a vida através dos Beatles. Será que ele fracassou em seu desejo de ser um ator? Eu me lembro dele no programa Hullabaloo, na tevê, tão pálido e desanimado e deslocado. Tão quieto! Seria ele o chefão mor, o sucessor do Coronel Parker? (...) Mas talvez ele fosse um gênio, como muitos dizem, preenchendo seus dias com maquinações fantásticas, planejando e fazendo estratégias para a carreira de seus ídolos, de modo que eles se tornassem, como se tornaram, nossos líderes supremos. (...) Se ele era um grande homem de negócios, exprimindo sua vontade através de quatro músicos, trazendo honestidade e integridade a um meio corrupto, ele deve ter sofrido muito quando os Beatles decidiram não mais se apresentar em público. O que havia para se fazer depois de dois filmes e nenhuma excursão? Acabaram-se as reuniões, as intrigas, os planos e os truques. Teria ele ficado sozinho, debruçado sobre manuscritos colossais, tentando achar as palavras mágicas, tentando trazer de novo à vida ao turbilhão do poder e da glória?". (Lou Reed).